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segunda-feira, 31 de maio de 2010

Esverdear, tornar sustentável, ecologizar ...

O adjetivo

Verde, sustentável, ecológico são adjetivos usados para qualificar várias situações. Enquanto as questões ambientais se concentravam na atenção para com os vegetais, árvores, parques, a elas se associou a cor verde: economia verde, partido verde, empregos verdes, tecnologias verdes, combustíveis verdes, energia verde; marketing verde. Ocorre, entretanto, que há agendas ambientais com várias cores: a agenda azul cuida das águas; a marrom combate a poluição ambiental; a verde trata da biodiversidade, das florestas, das unidades de conservação; a vermelha focaliza as questões socioambientais e a agenda branca aborda os aspectos institucionais da gestão ambiental.
Reduzi-las à cor verde é empobrecer o conceito e as múltiplas possibilidades de ação e ele associados.

O adjetivo sustentável hoje se aplica a tudo – desenvolvimento sustentável, economia sustentável, crescimento sustentável, planeta sustentável, mundo sustentável, agricultura sustentável, arquitetura e construção sustentáveis, turismo sustentável, propaganda sustentável; design, embalagem, mobilidade, sociedade, cidade, aldeia, empreendimento sustentáveis; idéia, visão, projeto, futuro, conversas sustentáveis. No Google há mais de cinco milhões de entradas para essa palavra; em inglês há mais de 60 milhões para sustainable e 30 milhões para sustainability. Aplicado a qualquer coisa, torna-se veículo de confusão e pouco esclarece. O desenvolvimento sustentável (conceito que se disseminou a partir de 1987) não equivale ao ecodesenvolvimento (usado na conferência de Estocolmo em 1972). O prefixo eco, presente no ecodesenvolvimento, se perdeu à medida que se disseminava a noção de sustentabilidade. O tripé clássico da sustentabilidade (economicamente viável, socialmente justo e ambientalmente prudente ou inofensivo) não abarca a riqueza e diversidade trazidas pela dimensão ecológica.

O ecológico aos poucos se insere na consciência e na ação. Somos ainda uma espécie com rudimentar consciência ecológica, ecoanalfabeta e ecoalienada, que conhece pouco sobre ecologia e menos ainda como aplicar o pensamento e os valores ecológicos em suas práticas. Há grande diferença entre o atual homo sapiens e o ainda virtual homo ecologicus. As civilizações ainda têm um longo caminho a percorrer no que se refere à consciência ecológica e sua tradução em ações. A ecologia extrapolou sua origem nas ciências biológicas e significa mais do que o estudo de bichos e plantas em sua relação com o ambiente.
As ciências ecológicas hoje se desdobram em dezenas de campos, da ecologia econômica à social, da ecologia energética à ecologia do ser. Ser ecologicamente consciente implica em ser economicamente viável (ecologia econômica) e o que é socialmente justo (ecologia social); além disso, implica em ser energeticamente eficiente (ecologia energética), culturalmente criativo (ecologia cultural), industrialmente convergente (ecologia industrial), cosmicamente integrado (ecologia cósmica), pessoalmente saudável (ecologia do ser, pessoal), comportamentalmente responsável (ecologia do cotidiano, ecologia da ação), ética e espiritualmente elevado (ecologia transpessoal), filosoficamente consistente (ecologia profunda). Essas dimensões e outras mais estão presentes na consciência ecológica integral e tem implicações praticas.
Assim, por exemplo, a ecologia energética oferece subsídios para a adoção de dietas alimentares vegetarianas. A ecologia cósmica oferece elementos para inserir a história humana e a história da terra na história do universo. E assim por diante. O biogeógrafo canadense Pierre Dansereau propõe ser preciso voltar aos fundamentos ecológicos e, com lucidez, clarear equívocos conceituais. Para avançarmos teoricamente e termos um modelo mental orientador da ação prática, é preciso resgatar a dimensão ecológica em seu significado integral.

O verbo

Esverdear, tornar sustentável e ecologizar são verbos que expressam o modo de ação amigável e a mudança no tipo de relacionamento do ser humano com o ambiente.
Esverdear (to green) a economia, os partidos, os empregos, evoca uma postura maquiadora, um tratamento superficial de questão e que exclui abordagem mais profunda; o que claramente não suficiente diante da magnitude da crise ambiental atual.

Tornar sustentável transmite uma conotação de permanência, de continuidade, de perdurar no tempo; como se fosse possível dar sobrevida a algo se encontra em estado terminal, afastando rupturas e mutações radicais.

Ecologizar é aplicar os conhecimentos das ciências ecológicas e a sabedoria da consciência ecológica às ações humanas. O uso desse verbo se iniciou de forma tímida e envergonhada, entre aspas. No livro O Verde é negócio, Hans Jöhr mencionava a “ecologização” da empresa, do escritório, da fábrica, do processo, do comércio internacional. À medida que nos tornamos ecoalfabetizados e que superamos nossa ignorância sobre o que é a ecologia, esse termo fecundo e includente é incorporado aos dicionários e torna-se mais compreensível. Para além do esverdeamento ou de tornar algo sustentável, ecologizar é um verbo que expressa a ação necessária nesse contexto de crise climática e ambiental e de mega crise da evolução.

Maurício Andrés Ribeiro

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